Antes de mais nada, colocarei aqui um novo projeto que circunda a ANAC para a implantação de uma nova forma de formação de pilotos.
Colocarei as palavras do próprio autor do projeto, sendo assim, livre de manipulação de minha parte.
O que muda na aviação brasileira com a MPL?
Muito tem se falado sobre a MPL, aquela licença que vai colocar um piloto recém-formado no assento do 2P de um jato comercial em menos de dois anos.
Afinal, qual será o impacto para a aviação?
A meu ver será positivo. Muito positivo.
Hoje temos três licenças: PP, PC e PLA. Com a publicação do novo RBAC61, serão quatro: PP, PC, MPL e PLA. A MPL é uma nova licença – Multicrew Pilot License, ou Licença para Piloto de Tripulação Múltipla, numa tradução livre.
Antes de entender o que é a MPL é preciso avaliar uma questão muito importante. Que caminho um aspirante a um posto no cockpit das principais companhias aéreas brasileiras deve seguir hoje?
Em rápidas palavras o candidato vai a um aeroclube ou escola de aviação e tira seu PP e PC.
Neste momento acontece o primeiro antagonismo. Ao mesmo tempo em que a autoridade aeronáutica garante que com o PC o piloto já pode exercer uma atividade remunerada na aviação, as companhias aéreas dizem que a experiência acumulada até aqui não é suficiente para que o piloto ocupe um lugar no assento do 2P de um jato ou turboélice comercial.
A fase entre a escola de formação e o emprego na aviação comercial é um abismo, para muitos, intransponível.
A companhia aérea quer que o novo piloto acumule mais horas. Quando o objetivo é voar numa companhia aérea, é questionável a qualidade da experiência que se acumula ao ministrar instrução numa escola ou aeroclube, puxar faixa no litoral ou voar para um fazendeiro, especialmente quando esta experiência é posta lado a lado com a proposta da MPL.
Depois que um piloto com PC na mão e algumas centenas de horas em sua CIV é contratado por alguma empresa aérea brasileira, há um período de adequação que hoje leva de oito a doze meses até que esteja em condições de compor tripulação. Esse prazo se deve, em grande parte, à qualidade aquém da esperada dos profissionais contratados.
Este é o panorama atual. E a MPL?
Dieter Harms, considerado o pai da MPL, tem explicado ao mundo o que é este novo conceito de formação de pilotos. Dentre as afirmações mais interessantes que ouvi dele está o fato de que a MPL veio para revolucionar a maneira como a instrução aérea é feita até hoje e que é praticamente a mesma desde os primórdios da aviação. A aviação, por outro lado, mudou bastante. De mero empurrador de manetes, o piloto passou a ser um gerente de sistemas e pessoas. Conceitos de Segurança de Voo foram aprimorados e a própria Segurança de Voo evoluiu para Segurança Operacional, mais abrangente. Conceitos novos foram criados, como o CRM, CFIT, e outros.
Um aparte sobre Dieter Harms. Ele foi comandante da Lufthansa e por boa parte da sua carreira acumulou função no setor de ensino da empresa que, dentre outras evoluções que a Lufthansa deixou de legado para a aviação está a solicitação à Boeing para a construção de um novo jato que atendesse algumas de suas linhas. Foi o nascimento do Boeing 737. Mais recentemente, partiu do Dieter Harms a iniciativa de convencer a ICAO de que seu método é eficiente. Hoje, diversos países na Europa, Oceania e Ásia já adotaram a MPL e mais de cinco mil pilotos foram formados segundo este novo conceito, sem que tenha havido problemas dignos de nota.
Como parte da estratégia da autoridade aeronáutica (ANAC) em adotar a MPL, o próprio Dieter Harms deverá vir ao Brasil ministrar palestras sobre o assunto. Em princípio, as palestras serão abertas para escolas de aviação e cias aéreas.
Qual é o segredo da MPL?
A empresa aérea diz à escola de formação quais competências, que capacidades e habilidades quer que seus novos tripulantes desenvolvam. A escola então cumpre o que a empresa solicita. A ICAO assume um papel de mediadora nesta conversa entre a empresa e escola e estabelece os requisitos mínimos. O país signatário da ICAO adota a formação segundo os critérios da MPL. Muito simples.
Resumindo.
1 – Teoricamente o candidato a piloto não precisa ter qualquer experiência de voo para iniciar o curso.
2 – Depois de passar num exame teórico de admissão de uma dada companhia aérea, os melhores candidatos serão submetidos a uma bateria de testes psicológicos que indicarão, com grande margem de sucesso, o grau de aptidão do candidato.
3 – O candidato aprovado vai cumprir todo o currículo que compreende teoria (incluindo os modernos conceitos de gerenciamento), prática de voo (MNTE, MLTE e IFR), incluindo glass cockpit, e treinamento em simuladores (Fixed Base e Full Flight). Ao longo da formação o candidato vai se familiarizar com a cultura da empresa que vai voar. Em algumas fases da formação, os próprios pilotos da companhia serão seus instrutores.
Posso ir a um aeroclube e fazer a MPL?
Não.
A MPL é uma licença que visa uma companhia aérea específica. A MPL da Azul será para formar os pilotos para a Azul e não servirá, por exemplo, para a Trip.
A possibilidade de migração da MPL entre companhias deverá ser prevista em regulamento.
Já sou PP ou PC, vou abater minhas horas na MPL?
Se houver este caso, deverá ser previsto no RBAC61.
Quem paga o curso?
A princípio, o mesmo que paga para tirar PP e PC, ou seja, o piloto.
O custo da formação, porém, pode ser dividido entre os interessados, cias aéreas e pilotos. Vai depender do modelo que cada empresa adotar no Brasil.
Para que a MPL alcance o sucesso desejável há de serem criadas linhas de crédito específicas para a formação dos pilotos. Já existem estudos e negociações com bancos neste sentido.
O que acontecerá com escolas e aeroclubes?
Vão continuar existindo por algumas razões.
1 – As empresas vão precisar de seus serviços para formar seus pilotos. A formação do aviador não é a atividade fim de uma empresa aérea. Este serviço tem sido terceirizado pela maioria absoluta das empresas que adotaram a MPL no mundo. Caberá à empresa escolher quais escolas formarão seus pilotos.
2 – O fato de adotar a MPL não significa que a empresa não possa contratar pilotos formados segundo o conceito anterior.
3 – Apesar de ser a maioria, nem todos os pilotos que se formam tem como objetivo seguir carreira na aviação comercial. Empresas de táxi aéreo, aviação executiva, pilotos agrícolas, etc. não deverão ser beneficiadas com a nova formação.
4 – Nos países que disponibilizaram a MPL, nem todas as empresas aéreas optaram por adotá-la. O mesmo deve acontecer no Brasil.
Só as companhias aéreas poderão ter MPL?
A criação de toda uma estrutura para formar pilotos segundo os critérios da MPL só é justificável se houver uma demanda razoável. Pode não ser atrativo para empresas com poucos aviões e somente será possível para as que operam segundo o RBAC135 e 121.
As empresas que operam helicópteros podem também formar seus pilotos segundo a MPL. Não há ainda no mundo alguma empresa que forme seus pilotos segundo a MPL. Pode ser uma boa solução para suprir a demanda por novos pilotos que vão atuar no pré-sal.
E o pé e mão?
O fato de não ter acumulado horas dando instrução aérea, puxando faixa ou voando para um fazendeiro não vai restringir ao piloto a sensibilidade para o voo?
Esta é uma questão levanta por várias entidades, entre elas a IFALPA, que inicialmente apoiou a idéia da MPL com cautela. A prática, porém, tem demonstrado que as habilidades desenvolvidas na formação segundo os critérios da MPL compensam e são mais úteis.
Quando vai entrar em vigor?
Para entrar em vigor, primeiro é preciso que o novo RBAC61 seja publicado. Não há prazo para isso, a ANAC ainda está analisando as cerca de 900 sugestões que foram feitas para o texto.
A ANAC deverá ainda publicar um Manual de Curso específico para a MPL.
Depois que tudo for publicado, será necessário que alguma empresa aérea decida se adequar à MPL.
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Por Ruy Flemming.
Então, qual sua opinião?
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